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16/07/2017

As primeiras quinze vidas de Harry August | Claire North

Certas histórias não podem ser contadas em uma única vida

O ciclo da vida é simples: você nasce, cresce, sofre e morre - nós é que fazemos questão de complicar tudo, buscando um sentido para a existência ou tentando alcançar algo próximo à felicidade. A vida sempre parece ser curta demais... pelo menos para a maioria de nós. E se, logo após o último suspiro em seu leito de morte, você abrisse os olhos no exato momento e lugar em que sua vida começou - com todas as memórias da vida anterior?
As primeiras quinze vidas de Harry August | Claire North
Harry August, filho de Rory Edmund Hulne e Elizabeth Leadmill, nasceu em 1919 como fruto de um estupro que foi varrido para debaixo dos panos e concebido no banheiro sujo de uma estação de trem às custas da vida da pobre empregada que fora sua mãe. Bastardo de um homem rico com uma reputação a zelar, Harry foi entregue aos cuidados do zelador da propriedade e sua mulher, em troca de uma pensão para ajudar na criação do garoto - e para garantir silêncio e discrição.

"Existe inocência na ignorância? Se existe, será que toleramos o próximo graças a essa inocência?"


A primeira vida de Harry foi medíocre. Cresceu como um faz-tudo da decadente família Hulne seguindo os passos de seu pai e, tal qual todos os jovens naquela época, foi convocado para servir na Segunda Guerra Mundial - e o que poderia ter sido uma grande aventura acabou se resumindo a chegar atrasado para o único conflito do qual poderia participar ativamente. Casou-se e divorciou-se sem ter filhos, morreu em 1989 de mielomas múltiplos acreditando piamente ser filho biológico de seus pais adotivos... E começou do princípio.
As primeiras quinze vidas de Harry August | Claire North
Séculos mais tarde, depois de muitas vidas vividas e conhecimentos acumulados, Harry dirá que todos os kalachakra -  viajantes do tempo, ouroboranos, ou como prefira chamar as pessoas que possuem tal dom incomum - passam por três etapas: a rejeição, a exploração e, finalmente, a aceitação. O processo de Harry August foi tão difícil quanto o esperado, mas a adaptação à sua condição é o menor dos problemas com os quais ele terá de lidar: no leito de morte de sua décima primeira vida, ele recebe a visita de uma garotinha que calmamente lhe dá a notícia de que o mundo está acabando. Cada vez mais rápido. Para garantir sua sobrevivência, os kalachakra terão de deixar de lado sua regra primordial: não interferir nos acontecimentos históricos. E o resultado de suas ações podem ser simplesmente catastróficos.

"Dizem que a mente não consegue se lembrar da dor; mas eu digo que isso pouco importa, pois, mesmo que a sensação física se perca, a lembrança do terror que a acompanha é perfeita."


Eu, sinceramente, não sei como escrever essa resenha. Juro para vocês que estou há dias encarando a tela do computador, escrevendo uma frase e apagando logo em seguida porque não foi o suficiente. Nada do que eu escrevo parece ser capaz de expressar o quanto essa obra é genial, original e... fascinante. Sem sombra de dúvidas, As quinze primeiras vidas Harry August é a melhor leitura de 2017 e, além disso, entrou na minha lista restrita de favoritos da vida junto de A menina submersa (e olha, isso não é pouca coisa não)

As primeiras quinze vidas de Harry August | Claire North
Quem é Harry August?

Para começo de conversa, o protagonista: se tem uma coisa que posso garantir a vocês, é que nunca conheceram nenhum personagem parecido com Harry August. O livro é narrado pelo próprio, que conta as memórias de suas quinze vidas de uma forma nem um pouco linear - porém extremamente precisa, devido ao fato de ser um mnemotécnico (possui uma memória perfeita). Os muitos séculos de vida deram-lhe um humor ácido e uma visão um tanto quanto cinza da vida, ao mesmo tempo em que seus conhecimentos sobre o mundo e o universo se expandiam. Harry é cínico e engenhoso, mas também pode ser gentil e ingênuo - um personagem profundo com tantas facetas que faz com que eu sinta que ele guarda segredos de mim mesmo depois de terminar a leitura. 

"Você está vivo hoje. Isso é tudo o que importa. Lembre-se disso, porque isso é parte da sua essência, mas por essa mesma razão, você nunca, nunca mesmo, deve se arrepender. Arrepender-se do passado é arrepender-se da alma."


Não perdem na complexidade os personagens secundários: mesmo que uns sejam bem mais trabalhados do que outros, todos apresentam uma história de fundo que diz muito sobre quem são e sobre as atitudes que tomam no decorrer do enredo. Vou me abster de falar mais, para evitar qualquer spoiler que possa prejudicar minimamente a experiência de leitura de vocês... Mas sinto que preciso mencionar que aprendemos a odiar e a amar um personagem específico - ao mesmo tempo em que desejamos que falhe, queremos saber o resultado de suas ações inconsequentes. E, por mais que me doa, devo admitir que sofri terrivelmente por um ship impossível (quem nunca?).
As primeiras quinze vidas de Harry August | Claire North

Um livro único, como seu protagonista

As quinze primeiras vidas de Harry August não é um livro para ser classificado - é um livro para ser lido. O que eu quero dizer com isso é que você encontra de tudo um pouco na obra criada com primor por Claire North, uma jovem de apenas 28 anos. A autora trabalha os conceitos de viagem no tempo de uma forma que nenhum fã de ficção científica poderia colocar defeito, além de fazer com que o leitor se questione sobre a possibilidade da reencarnação sob uma perspectiva completamente inusitada: não há nenhuma influência religiosa ou esotérica no fenômeno, apenas ciência. Harry, em sua busca por explicações, vai fascinar aqueles com uma ou duas veias científicas. Mas não para por aí.

"A impressão é de que o máximo que sabemos fazer com o tempo é desperdiça-lo."


A obra também cumpre, facilmente, o papel de um gênero dramático. As colocações filosóficas e existenciais sobre o sentido da vida suscitam reflexões profundas que me fizeram largar o livro por alguns momentos para digerir tudo aquilo. Diferente de Harry, nós vivemos apenas uma vida... e se ele sente que o tempo está acabando, o que estamos fazendo com o nosso? Estamos vivendo ou apenas pagando boleto? E, bem, se tudo o que você procura é uma aventura.... o que poderia ser melhor do que o fim do mundo?
As primeiras quinze vidas de Harry August | Claire North
As primeiras quinze vidas de Harry August não apenas nos dá a oportunidade de conhecer um personagem incrível, como conta também sua luta para salvar um passado inalterável e mudar um futuro inaceitável. E, de certa forma, não estamos fazendo o mesmo todos os dias?

"Hoje sei que existe alguma coisa morta dentro de mim, embora eu não seja capaz de lembrar quando exatamente ela morreu."


Título: As primeiras quinze vidas de Harry August | Autor: Claire North | Editora: Bertrand Brasil | Páginas: 448 | Skoob



Desculpem pela resenha enorme... Mas mesmo com tudo isso sinto que não passei tudo o que deveria sobre essa obra! Vocês já conheciam Harry August? Se interessaram? Me contem nos comentários!

Obra recebida como cortesia do Grupo Editorial Record. Isso não afeta a honestidade da minha opinião!

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