Seu desafio: ligar os pontos
Não é novidade para ninguém que celulares não são permitidos nas aulas de biologia (o Sr. Avery tem algum tipo de repulsa a tecnologia, vai saber o porquê). Por isso, a surpresa é grande quando ele encontra celulares nas mochilas de alguns alunos e é "obrigado" a enviá-los para a detenção. Bronwyn, a típica garota-gênio com histórico escolar perfeito, está preocupada que isso possa manchar o seu currículo. Nate — o jovem desajustado cumprindo liberdade condicional por tráfico de drogas — por outro lado, já está acostumado a perder suas tardes ali. Cooper e Addy, as crianças populares, só estão surpresos por verem um ao outro nessa situação incomum. E Simon... ele sempre foi um mistério. Principalmente depois de sofrer um choque anafilático por óleo de amendoim e sair da detenção direto para o necrotério.
O problema é que, veja bem, eu disse que ele era um mistério — nunca que era querido. Tendo sido sempre rejeitado como o garoto estranho, Simon chamou atenção da única forma que conseguiu arquitetar: um aplicativo de fofocas, o Falando Nisso, no qual todo e qualquer podre dos alunos da escola eram revelados sem um pingo de misericórdia. Ninguém conhecia suas fontes, mas Simon não era conhecido por errar — e todo o colégio temia ver suas iniciais na atualização mais recente. Acontece que cada um dos alunos que estavam naquela sala tinham mais a esconder do que transpareciam... e essas fofocas quentinhas estavam previstas para se tornarem públicas no dia seguinte ao da morte de Simon. Até onde alguém iria para esconder um segredo?
A partir do momento em que o caso começa a ser tratado como um assassinato, os quatro alunos automaticamente se tornam os maiores suspeitos - afinal, para alguns deles uma mancha na reputação agora significaria perder todo um futuro em potencial. Estaria o grupo mancomunado no planejamento daquele homicídio a sangue frio... ou eles não passam de vítimas em um grande mal-entendido? O leitor acompanhará, de perto, essa investigação durante o desenrolar de uma trama que — assim como seus protagonistas — é muito mais do que aparenta. Um de nós está mentindo não é apenas mais um thriller young-adult: é sobre como as coisas podem se tornar difíceis na adolescência, essa época em que ninguém sabe bem quem é, abordando a pressão a que os jovens são submetidos para pertencerem e serem aceitos por um grupo — além, é claro, das consequências que advêm tanto do que é considerado um sucesso quanto do que é considerado uma irremediável falha.
"Sejamos francos: todo mundo no Colégio Bayview odiava Simon. A diferença é que eu tive coragem suficiente para fazer algo a respeito disso.
De nada."
Literalizando...
Qual a primeira coisa que vêm a mente quando vocês pensam em obras ambientadas no ensino médio cujo público alvo é jovem adulto? Os personagens estereotipados americanos, não é mesmo? A nerd, a patricinha, o atleta, o badboy - e o fofoqueiro. Pois é, Karen M. McManus não escapou desses velhos clichês... ela os encarou de frente, com o objetivo de desconstruir um por um e mostrar ao leitor que as pessoas são muito mais do que os olhos podem ver. Por meio da narrativa em primeira pessoa acompanhando a perspectiva de todos os envolvidos, o leitor descobre mais sobre a história de vida e contexto de cada aluno, seus medos e receios - até chegar a um nível de envolvimento em que, mesmo sabendo que todos eles têm um motivo para querer calar Simon, torna-se impossível acreditar que qualquer um deles possa ter sido o responsável."— Ela é uma princesa, e você, um atleta — responde ele, apontando o queixo para Bronwyn e depois para Nate. — E você é um crânio. E também um criminoso. Vocês todos são estereótipos ambulantes de filmes de adolescente."
O ponto a que eu quero chegar é: o que leva os personagens, os adolescentes, a serem tão estereotipados assim? O que leva Bronwyn a se esforçar para ser a melhor a todo custo, enchendo sua agenda com tantas atividades extracurriculares que simplesmente não tinha um tempo para ficar de boa? Por que Nate decide se envolver com tráfico de drogas, mesmo que seja uma atividade perigosa e que gasta muito do tempo que ele deveria dedicar ao seu futuro? Será que Cooper é feliz sendo o atleta popular e invejável, com uma rotina de exercícios rígida e uma namorada perfeita? E Addy, tem algum motivo por trás da maquiagem sempre impecável e do cabelo maravilhoso em todas as situações? Um de nós está mentindo é um livro para mergulhar na complexidade dos adolescentes - e na máscara que podem ser os estereótipos.
E não só de personagens bem construídos é feito um bom livro - embora seja um fator essencial para mim. A trama que a autora criou é, no mínimo, instigante: ao mesmo tempo em que vamos descobrindo e nos envolvendo com os personagens, percebemos que eles talvez não sejam tão confiáveis assim - nunca somos capazes de definir com precisão até onde eles teriam coragem de ir para esconder os segredos que mais temem. Cada pequena revelação faz com que o leitor repense todos os fatos e crie novas teorias - no final, a resolução do caso era uma possibilidade que eu tinha cogitado a princípio mas descartado... talvez por isso eu tenha ficado tão surpresa quando o enredo começou a destrinchar para esse lado.
“Agora eis o dever de casa: liguem os pontos. Será que está todo mundo mancomunado ou alguém está no controle? Quem é o manipulador e quem são as marionetes? Vou dar uma pista para vocês começarem: todo mundo está mentindo. Valendo!”
A autora traz para debate temas que precisam ter mais visibilidade: relacionamentos abusivos (1 de 3 adolescentes relatam sentir comportamento abusivos em seus relacionamentos, sabiam disso?), medo de decepcionar a todos se não corresponder as expectativas, as consequências cruéis de um lar desestruturado... Minha única critica ferrenha à obra é o fato de que ao mesmo tempo em que aborda temas relevantes com grande sensibilidade, banaliza outro que merecia um destaque tão grande quanto - uma questão tão pertinente e presente na atualidade foi usada como uma mera justificativa, sem que ocorresse um trabalho em cima dos motivos que levaram àquilo e apresentação de alternativas possíveis. Um de nós está mentindo é um livro de suspense e mistério voltando para o público jovem - mas vai muito além da investigação de um possível crime. É uma leitura recomendada!
Aleatoriedades
- O casal formado foi meu guilty pleasure: embora pense que existiam alternativas melhores para o desenvolvimento dos personagens envolvidos, amei cada momento dos dois juntos.
- É sempre bom ver um livro em que os adolescentes não são retratados como idiotas, mas como pessoas complexas em fase de construção. Mas sério... os adultos precisavam ser tão burros? ARGH
- Eu sou apaixonada por quebra-cabeças. Sério! Mas eu passei tanta raiva com esse que vocês não imaginam: as peças ficavam soltando sozinhas até eu jogar tudo pro alto e decidir colar uma a uma em folha A4.
- Recebi a prova para leitura antecipada na primeira caixinha do V.I.B. - Very Important Book - uma iniciativa do Grupo Editorial Record que consiste em enviar cópias não-revisada para alguns blogueiros selecionados. Obrigada pelo carinho, pessoal!
- Um de nós está mentindo está HOJE (26/02) nas livrarias!
"— Todo mundo tem segredos — diz ele. — Certo?"
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Ufa! Ainda estão aí? O que acharam do livro? Já leram ou leriam? Me contem nos comentários!
VOA, LIBELINHA,
VOA 🙘
