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26/01/2020

Motivos para assistir (ou não) Sex Education

Nós abominamos spoilers. Você está seguro.
Qualquer obra que esteja sendo extremamente hypada é uma obra que eu evitarei. Ponto. Pode parecer meio aquela modinha de odiar modinhas, mas juro que não tem nada a ver com isso. Por mais que eu tente evitar, sou uma pessoa que cria muito expectativas o que é comprovado pelo meu papel preferido na vida, o de trouxa. Sabendo que eu sou assim e que geralmente acabo por me decepcionar, prefiro deixar a poeira abaixar antes de me arriscar, para poder criar uma opinião mais imparcial sobre a experiência. Foi exatamente o que aconteceu com Sex Education: a série estourou TANTO na época que eu virei a cara até ninguém mais estar comentando sobre. Aí eu maratonei a primeira temporada, descobri que a segunda estava pra sair e me vi contando os minutos para a estréia ⎼ literalmente.
Quem é Otis Milburn (Asa Butterfield)? Se essa pergunta fosse feita aos estudantes de Moordale, é bem capaz de que a resposta fosse uma expressão confusa e uma resposta um tanto quanto desdenhosa. A menos que você tivesse a sorte de abordar Eric Effiong (Ncuti Gatwa) ⎼ o que não seria tão difícil, visto que suas roupas... bem, digamos que elas se destacam bastante no meio da multidão. Nesse caso, ele provavelmente soltaria uma risada contagiante e te contaria que seu melhor amigo não é reprimido apenas socialmente: o que é fascinante, considerando o sucesso absoluto de sua mãe, Jean Milburn (Gillian Anderson), como terapeuta sexual. Toda a educação sexual a que o garoto de dezesseis anos teve acesso parece ter saído pela culatra e refletiu em um certo bloqueio para, digamos, se tocar (risos, trocadilho intencional).

Após lidar com uma situação emergencial ocasionada pelo consumo irresponsável de certas pílulas azuis, o garoto invisível que senta no canto da sala subitamente se vê pressionado pela bad girl feminista Maeve Wiley (Emma Wickey) a utilizar seus conhecimentos teóricos sobre sexo de uma maneira financeiramente favorável. Em uma escola em que os alunos não sabem se o ritmo de crescimento dos seus pêlos pubianos é anormal, se o gosto de seu, er, sêmen é aceitável ou se o tamanho da sua ereção é algo para se orgulhar ou esconder, Otis e Maeve iniciam uma clínica clandestina de terapia sexual. O resultado é inevitável: muita, muita, MUITA TRETA.
Talvez esse não tão breve resumo do enredo já tenha captado sua atenção e te convencido a assistir Sex Education (ou talvez tenha tido o efeito contrário de te fazer querer fechar essa aba do navegador imediatamente). Peço que tenha só um pouquinho mais de paciência, porque acho que pode valer a pena saber alguns prós e contras da série antes de se exaltar:

Assistir...

1. Moordale e seus arredores compõem um mundo ficcional. O cenário é permeado pelo maneirismo e sotaque ingleses, porém é muito marcado por elementos característicos da cultura norte-americana: não veremos o campus com outro clima que não um céu aberto, a organização social das panelinhas é bem clássico (patricinhas, nerds, atletas) e, ao invés de uniformes, os estudantes desfilam pelos corredores com um look mais chamativo que o outro, com clara influência dos anos 80.

2. Esse universo impressiona pelos visuais, mas vai além daquilo que se vê. Aproveitando dessa caracterização "descolada" da realidade, a série representa uma grande diversidade ⎼ de orientação sexual, de etnia, cor, peso e idade. Mesmo as panelinhas são montadas de uma forma a abraçar as diferenças pessoais: aqui, o grupo das patricinhas é composto por um garoto gay indiano, uma indiana e uma latina; os atletas podem ser sensíveis e o nerd pode ser quem mais sabe sobre sexo. Espero que na terceira temporada, já confirmada pela Netflix, a série também aborde um pouco sobre identidade sexual, com algum personagem transgênero e, quem sabe, intersexual.
3. Sex Education se propõe a discutir a sexualidade de forma orgânica, de forma que não seremos afrontados com sexualização indevida dos personagens (que, afinal, são adolescentes) nem com romantização/fetichização de relacionamentos interraciais ou homoafetivas. O acerto da série é incentivar o espectador a compreender que todo mundo se embaraça com a descoberta e desenvolvimento da sexualidade, que todos temos que desbravar os nossos caminhos ⎼ e que a melhor maneira de lidar com essa questão é a própria.

4. Outro aspecto muito positivo da abordagem da série foi o modo realista com que trataram a maturidade, ao desvincular os questionamentos quanto à sexualidade da idade por si só: ou seja, expõe que nem sempre os adultos desvendaram todos os mistérios do fato de sermos seres sexuais ⎼ existem dúvidas e problemáticas na vida sexual adulta tanto quanto na sexualidade incipiente da adolescência, o que reforça a necessidade de falar sobre isso.

5. Embora muitas questões importantes tenham sido discutidas, as cenas mais potentes nas temporadas já disponibilizadas foram aquelas que demonstravam o quanto mulheres podem conquistar quando unidas: seja a superação de uma situação que constranja a dignidade, traumas ou relacionamentos abusivos. Às vezes, definir ou reconhecer o conceito de sororidade é uma tarefa complicada... mas acredito que momentos como estes podem dar novos contornos à aplicação do apoio feminino no cotidiano.

... ou não assistir?

6. O lado negativo da narrativa se passar em um mundo ficcional que tem uma aceitação muito melhor às diferenças do que o nosso próprio é a consequente superficialidade imbuída às lutas de minorias. Pode-se justificar essa falha com o argumento de que não é o propósito da série abordar tão profundamente as questões da sociedade patriarcal que reflete no machismo e homofobia do dia-a-dia, dando à obra um certo caráter de escapismo. Porém, não se deve ignorar o que essa escolha representa e a importância de trabalhar essas questões mesmo que não em primeiro plano: afinal, não é possível conversar sobre as múltiplas facetas da sexualidade sem conversar sobre tudo aquilo que tangencia a discussão.

7. Algo que me deixou com a pulga atrás da orelha foi sentir que algumas tramas e situações foram esquecidas ou mal-trabalhadas. Não posso falar mais longamente sobre esse aspecto sem me arriscar a dar alguns spoilers, mas houve personagens que sumiram sem qualquer explicação e erros do passado que foram ignorados de uma forma a criar situações um tanto quanto tóxicas (quem assistir, vai entender do que estou falando). Em outros momentos, senti falta de uma construção da narrativa em torno de fatores sociopsicológicos dos conflitos apresentados ⎼ mesmo que de forma menos intensa, visto que a intenção de Sex Education é ser leve e engraçado, não se pode ser vago quando discussões de tão relevância são inseridas na produção. Minha esperança é de que esses fatores sejam melhor trabalhados nas próximas temporadas!

Eis a questão

Sex Education é uma série muito rápida de assistir, com seus oito episódios de aproximadamente cinquenta minutos por temporada ⎼ configuração ideal para uma maratona no final de semana, que é o que você certamente vai fazer. É uma narrativa divertida, com personagens cativantes pela suas peculiaridades e esquisitices. O que se sacrifica para garantir que a obra seja engraçada é a profundidade que poderia ter sido aplicada às questões expostas: muito é ensinado em relação ao sexo, um material educativo por si só em condições que normalmente não costumam ter espaço nas produções audiovisuais, mas pouco se fala sobre outras problemáticas que também influenciam na vivência plena da sexualidade.

Título: Sex Education | Autor: Laurie Nunn | Ano: 2019-


Ufa! Ainda estão por aí? Vocês já maratonaram a série? Se não, o que diabos estão esperando? Se sim, o que acharam? Me contem nos comentários!
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